quinta-feira, 10 de dezembro de 2015

A confiança e as unhas

"A confiança perdida é difícil de recuperar. 
Ela não cresce como as unhas
(Johannes Brahms)



Há algo que é comum a qualquer indivíduo, relacionamento, equipe, família, organização, nação, economia e civilização no mundo todo. Algo que, se faltar, destruirá o governo mais poderoso, o negócio mais bem sucedido, a economia mais próspera, a liderança mais influente, a maior amizade, o caráter mais forte, o amor mais profundo. Por outro lado, se desenvolvido e estimulado, tem o potencial de criar sucesso e prosperidades sem precedentes em todas as dimensões da vida. No entanto, é a coisa menos entendida, mais negligenciada e mais subestimada em nossos tempos. É a confiança.

De forma simples, confiança significa ter certeza de que a pessoa não esconde nada e é sincera. O oposto da confiança – a desconfiança – é a suspeita sobre sua sinceridade. Quando você confia nas pessoas, você confia em sua integridade e em suas competências. Quando desconfia das pessoas você desconfia de suas intenções e atitudes e de sua integridade, sua agenda, suas competências ou seus antecedentes.
A confiança sempre produz dois resultados – a velocidade e o custo. Quando a confiança decresce, a velocidade também decresce e os custos aumentam.” (trecho do livro O poder da confiança, de Stephen Covey)

A confiança é a base do relacionamento entre seres humanos. Quando a confiança decresce, a velocidade com que as coisas acontecem diminui drasticamente. Qualquer ação, por mais simples que seja, demora muito mais a ser feita, porque ninguém acredita na pessoa/governo/empresa que a está executando. Um contrato que poderia ser assinado rapidamente com alguém em quem confiamos vai demorar muito mais para ser assinado se não existe confiança entre as partes.

Ao mesmo tempo, sem confiança, os custos para fazer funcionar sua organização/governo/vida aumentam significativamente. Sem confiança, um governo ou empresa precisa pagar juros mais altos para se financiar; uma empresa como a Vale, que perdeu a confiança da sociedade pela forma como está lidando com a tragédia de Mariana, vai ter custos muito mais altos de operação do que teria se tivesse sido transparente, ágil e justa na sua resposta ao acidente.

Algumas vezes acertamos, nas outras aprendemos

O pior é que construir a confiança é um processo longo e trabalhoso, mas perdê-la é muito fácil... Para construir confiança precisamos agir com transparência e sinceridade, não mentir e não ter receio de admitir seus erros quando eles acontecerem. É tentador inventar mil razões para justificar o erro. Minha experiência é de que quando um erro é cometido o melhor é simplesmente admiti-lo, sem tentar explicar o inexplicável. E tentar aprender com a experiência...


Retrato (Cecília Meireles)
Eu não tinha este rosto de hoje,
assim calmo, assim triste, assim magro,
nem estes olhos tão vazios,
nem o lábio amargo.
Eu não tinha estas mãos sem força,
tão paradas e frias e mortas;
eu não tinha este coração
que nem se mostra.
Eu não dei por esta mudança,
tão simples, tão certa, tão fácil:

Em que espelho ficou perdida
a minha face?

Uma das pessoas que mais confiava era o meu avô. Uma vez ele me disse para eu ser sempre fiel a si mesmo. Na época achei que seria fácil, mas hoje vejo que manter a coerência entre o que falamos/pensamos e o que fazemos não é nada trivial... mas é essencial. Quando nos afastamos do que acreditamos, daquilo que somos, perdemos tudo: o respeito, a confiança, nossa identidade, nossa face...

O país perdeu a confiança em quem nos governa. Eles perderam a sua face e entregaram sua alma... Teremos um longo caminho para reconstruir o Brasil. Vamos ter que caminhar muito e vamos precisar do todo mundo mas, sobretudo, precisaremos aprender com os erros e entender que a saída da crise não virá da cabeça de nenhum iluminado. O modelo populista e dos “salvadores da pátria” se esgotou.

O que precisamos é seguir nosso caminho “com os pés livres, de mãos dadas, e de olhos bem abertos” (Guimarães Rosa).



Um comentário:

  1. Adorei o texto, sem falar na grande Cecília Meirelles, outra GRANDE sacada, a vulnerabilidade do nosso momento econômico e vulnerabilidade poética diante de um tempo tão precioso,tão marcante e tão verdadeiro! Parabéns, Marco!

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